domingo, 25 de novembro de 2018

MAXIPIRULITO, ULTRAVIOLETA!


Se tem uma coisa que precisa mudar (talkey!), é trabalhar nas escolas a literatura contemporânea por último. Esta semana foi cheia de emoções e debates interessantíssimos sobre a música de Chico Buarque e outras composições da época da ditadura militar. Definitivamente, a juventude tem sede de saber sobre seu passado, pelo menos o recente, aquele que se lhe aproxima mais.
Fugindo [pero no mucho] das canções tradicionais (Apesar de Você, Cálice, Geni e o Zepelim...), trabalhei os musicais “infantis”. Os trabalhos selecionados foram Ciranda da Bailarina (1983) e Piruetas (1981), do Chico; e O Circo, de Sidney Miller (1967).
De cara, as turmas perceberam, pelas datas, que as letras poderiam conter “mensagens subliminares”. Mas não faziam uma ideia exata do que descobririam. Grande foi sua surpresa ao fazer o exercício de interpretação dos textos.
Comecei pela Bailarina. Essa pessoa, sem defeitos, parece também não ter virtudes. Afinal, a música é composta por uma série de negativas e nenhuma afirmação sobre a protagonista.
E não tem coceira
Verruga nem frieira
Nem falta de maneira
Ela não tem
[...]
Nem unha encardida
Nem dente com comida
Nem casca de ferida
Ela não tem
Só para realçar a importância dessa ausência de caracteres, notem a diferença em relação à Geni (de Geni e o Zepelim - 1978), um travesti coberto de defeitos, mas que é quem, no fim das contas, salva o dia.
Mas, de fato, logo ela
Tão coitada e tão singela
Cativara o forasteiro
[...]
A cidade em romaria
Foi beijar a sua mão
O prefeito de joelhos
O bispo de olhos vermelhos
E o banqueiro com um milhão
Vai com ele, vai, Geni!
Vai com ele, vai, Geni!
Você pode nos salvar
Você vai nos redimir
Você dá pra qualquer um
Bendita Geni!
Nossa “heroína”, ao contrário, não salva ninguém. Não comete erros, tampouco acertos. Seus passos são controlados, ensaiados, metódicos talvez, decorados com certeza. Não faz nada, absolutamente nada além do que manda a coreografia, ou seja, sempre dança conforme a música.
Em minha pesquisa, nada encontrei que confirmasse o que estou prestes a dizer (o que não surpreende, dado o aspecto apocalíptico das canções da época). Então avisei os estudantes que tratassem como uma suposição apenas (alerta que também faço a você) e comecei: Há quem afirme que bailarina pode ter sido um código, nos tempos da ditadura, para se referir ao dedo-duro, aquela pessoa que, para salvar a própria pele, entregava toda a rapaziada (tomando uns tapas ou não).
É um tema um tanto controverso. Como falei, faltam informações. O próprio Chico nada fala sobre isso. Todavia, que não se trata de uma simples música infantil, atesta-o a própria letra.
Reparando bem, todo mundo tem pentelho
Só a bailarina que não tem
Chico provavelmente sabia que que esse detalhe “íntimo” traria consequências. Era praticamente um recado: “Olha só, pessoal! Quando virem um trabalho meu censurado, prestem bem atenção na letra.” E que bailarina é um código pode-se deduzir de sua recorrência nas canções de protesto, como a de Sidney Miller (O Circo - 1967):
Fala o fole da sanfona, fala a flauta pequenina,
Que o melhor vai vir agora, que desponta a bailarina.
Que o seu corpo é de senhora, que seu rosto é de menina.
Quem chorava já não chora, quem cantava desafina,
Porque a dança só termina quando a noite for embora.
Tendo os olhos treinados, pode-se perceber aqui a relação entre a bailarina e a tortura. De fato, enquanto eu escrevia esse texto, minha revisora preferida (minha esposa, historiadora) fez outras pesquisas e encontrou o seguinte:
“Adolescentes internados no Centro Socioeducativo (CSE) em Boa Vista [RR] sofrem, cotidianamente, torturas como medida disciplinar dentro da unidade. É o que aponta um relatório do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT) apresentado nesta terça-feira (16) por Fernanda Giviez, perita do órgão.
De acordo com a perita, os internos chegam a passar 12 horas algemados em grades com as mãos para cima e nas pontas dos pés. Esta é uma prática de tortura conhecida como ‘bailarina’.
[...]
Aqui é utilizada a ‘bailarina’, que é uma prática de tortura utilizada durante a ditadura civil-militar no Brasil.
(Para ler na íntegra, clique aqui)
Voltando à música do Sidney Miller, importa observar que a imagem do circo está intimamente relacionada às mais terríveis práticas desumanas da ditadura. Caetano e Gil, por exemplo, batizaram o primeiro álbum da Tropicália com o singelo nome Panis Et Circensis (1968). Essa – a velha máxima romana – era a política dos militares: pão e circo. Na voz dos jovens da MPB, o entretenimento popular virou código para a tortura. Saber disso dá outro significado à letra da canção:
Vai, vai, vai começar a brincadeira.
Tem charanga tocando a noite inteira.
Vem, vem, vem ver o circo de verdade.
Tem, tem, tem picadeiro e qualidade.
Bem me lembro o trapezista, que mortal era seu salto,
Balançando lá no alto parecia de brinquedo.
Mas fazia tanto medo que o Zezinho do Trombone,
De renome consagrado, esquecia o próprio nome
E abraçava o microfone pra tocar o seu dobrado.
[...]
Vai, vai, vai terminar a brincadeira.
Que a charanga tocou a noite inteira.
Morre o circo, renasce na lembrança.
Foi-se embora e eu ainda era criança.
O mesmo acontecendo com outras músicas, de outros compositores, com a mesma temática. Vejamos outro exemplo, Piruetas de Chico Buarque (1981):
Dez mil cambalhotas,
cem mil cambalhotas,
Bravo! Bravo!
Maxicambalhotas,
extracambalhotas,
Bravo! Bravo!
Salta além da estratosfera
e caia onde cair,
Que a galera morre de rir!
Ai, minhas costelas!
Já tô vendo estrelas!
Bravo! Bravo!
Ai, minha cachola!
Não tô bom da bola!
Bravo! Bravo!
Lona... nuvens...
Tomba no hospital!
Uma pirueta, uma cabriola,
Uma cambalhota,
não tô bom da bola!
E o pessoal delira...
Maxipirulito, ultravioleta,
Bravo! Bravo!
Uma educanda, depois disso, virou para mim e disse, brincando (ou não), que estraguei sua infância. Juro que não era minha intenção, mas... Feitas as devidas considerações, revimos as letras das músicas (convite que faço a você também, deixando logo abaixo o link para ouvi-las) e deixei que cada um, cada uma terminasse de analisá-las e tirasse suas próprias conclusões.
Obs.: E aí? O que achou? A notícia vinculada a este texto é um fato isolado, ou devemos nos preocupar com a possível atualidade deste tema?



domingo, 18 de novembro de 2018

O FRUTO DO VOSSO VENTRE


E se? E se Jesus fosse mulher? Dizem que Deus – perfeito que é – não pode ser limitado a nenhum conceito, dimensão ou categoria (como gênero, por exemplo). Todavia, mesmo a visão mais amorosa do sagrado ainda é um Abba, paizinho.
Você sabia que um dos nomes de Deus, Shadday (Gn 17,1; 28,3; etc.), pode ter vindo da palavra hebraica Shad, “útero”? E que o Espírito de Deus, que pairava sobre as águas (Gn 1,1), era uma entidade feminina: a Ruah? Toda representação feminina do divino foi “esquecida” ou apagada intencionalmente (Shadday, por exemplo, foi traduzido por Todo-Poderoso).
Mas isso mudaria se Jesus fosse mulher? Olhando para o modo como os discípulos trataram os relatos de mulheres que experimentaram a ressurreição, suspeito de que a Nazarena não teria nem sido ouvida. Em Lucas, por exemplo, diziam os discípulos de Emaús: “Bem é verdade que as mulheres nos deram um susto. Foram ao túmulo e não encontraram o corpo. Alguns dos nossos foram e encontraram tudo como elas haviam dito. Mas ninguém viu Jesus.” (Lc 24,22-24)
Ah, mas isso era com a Madalena. Os evangelhos são praticamente unânimes em dizer que foi ela a primeira a fazer a experiência do Cristo ressuscitado. Ora, é senso comum dizer que ela era adúltera, pecadora, prostituta, endemoninhada. Em um outro momento, podemos desmitificar a imagem dessa mulher, que foi prostituída ao longo do tempo (leia, por exemplo, Jo 8 e perceba que não se diz o nome da adúltera; logo, não deve ser Madalena). Mas agora vou propor outro exercício. Pensemos em outra Maria, a mãe de Jesus. Um dia ela chegou para José e disse que ia ser mãe, e o pai seria o Espírito Santo. Tranquilo, né!? Sussa... Mas José intentou rejeitá-la por isso (Mt 1,18-19). Precisou de um ser dotado de autoridade, isto é, de um anjo (entidade assexuada, assim como Deus; no entanto, ambos são designados por substantivos masculinos) para dissuadi-lo dessa ideia (Mt 1,20.24).
Admitamos: O fato é que, se Yeoshuá fosse mulher, suas palavras não teriam sido sequer levadas em consideração, nem ontem, nem hoje. Quantas pessoas devotas de Maria a veneram por sua célebre frase: “[Deus] depôs os poderosos de seus tronos e os humildes exaltou”? (Lc 1,52) Não é a tônica mariana crer na santa como intercessora apenas, como aquela cuja função seria – única e exclusivamente – facilitar o acesso junto a seu filho?
Para enfatizar o rebaixamento de Cristo à condição humana, Paulo o chama de nascido de uma mulher (Gl 4,4). Essa expressão é usada em outros textos bíblicos e parece ser pejorativa (cf. Jó 14,1; 15,14; Lc 7,28). Entretanto, convém destacar os dois cânticos de Lc 1: o de Maria (vv. 46-56) e o do Zacarias (vv. 67-79). Enquanto o menino (isto é, o projeto) que nasce das elites (seu pai é sacerdote) é, no máximo, um sinal (o que aponta para o Messias), o que nasce de uma menina pobre subverte as estruturas (“cumulou de bens os famintos e despediu os ricos de mãos vazias”). Para além da oposição ricos x pobres, tracemos outro paralelo: Existe, sim, uma via de salvação para quem acredita na lógica do Templo, mas somente o rompimento com o sistema patriarcal gera a verdadeira mudança.
Se pensarmos na recente disputa pelo poder, veremos muita gente de esquerda – eu mesmo, durante um bom tempo – sentindo-se derrotada pelo resultado das urnas. Ora, nossa derrota já começou na escolha da solução para os nossos problemas. O patriarca Bolsonaro venceu porque o patriarca Lula não pôde concorrer. O sistema que aí está não permite uma verdadeira revolução. O que mudou, efetivamente, nos 13 anos do PT no poder? O povo podia consumir mais. Importante benefício para a população, mas que em nada mudou a cultura exploratória do meio ambiente e depredatória de recursos naturais e finitos. A proposta, de fato, alimentou e vestiu muito mais gente do que nos governos anteriores, especialmente os pobres, mas nada tinha de sustentável, ecológica e economicamente, a longo prazo.
O que acabo de dizer está longe de ser um discurso conformista, ou uma rendição ao novo governo. Nada de torcer para que dê certo um projeto que não esconde de ninguém suas intenções elitistas, excludentes, homofóbicas, misóginas, racistas... É inegável que o prejuízo será infinitamente maior com a ascensão de um homem cujo discurso desperta nas pessoas o que elas têm de pior. Antes, o que quero discutir é a estratégia de resistência. Queríamos a eleição do (patriarca) Ciro ou Haddad por acreditar numa maior abertura para debater as necessidades do povo. Isso não podemos perder de vista! O sistema é injusto por si só, independente de quem assuma o poder, homem ou mulher. Como promoveremos a verdadeira paz (Jo 14,27), como alcançaremos a terra sem males, onde “corre leite e mel” (Ex 3,8), se continuamos a acreditar no sistema baseado no macho salvador da pátria?
Talvez seja impossível dizer agora o que fazer. Mas é possível perceber o que NÃO fazer. O papel da resistência não é, de forma alguma, submeter-se ao sistema. Ele é o problema. Seus princípios são o problema. Sua lógica funciona da mesma forma, independente da posição política de quem ocupa o cargo mais alto. Basta lembrarmos do Lula dizendo que das tais alianças (com praticamente toda a nata do patriarcado brasileiro) dependia a governabilidade do país (e o final dessa história conhecemos muito bem!). A derrota foi dura, doída, sim, mas pode significar um renascer, a assunção de um projeto de vida, centrado no amor, algo que definitivamente o patriarcalismo não pode nos dar.

sexta-feira, 9 de novembro de 2018

LEVANTEM-SE E COMAM


Buenas... Conforme eu havia prometido, eis a segunda parte de uma análise do cenário pós-eleitoral que iniciei em meu post anterior (perdeu? leia aqui!). O olhar, naquele momento, tinha um viés mais artístico (musical e literário, por assim dizer). Agora, de acordo com o combinado, segue um olhar mais teológico sobre o assunto.
Recapitulando, eu havia dito que a eleição do Voldemort me deixara com medo. Na verdade, trata-se de uma mistura de sentimentos: pavor, derrota, impotência... Isso me manteve paralisado por um tempo, mas logo percebi que não é o fim do mundo, que nada de novo vai acontecer se ficarmos quietos, esperando os ventos mudarem.
Lembrei, então, de Elias. Ele viveu no tempo de Acab, rei de Israel [874 a 853 a.C.], cuja idolatria levou o povo à fome e à miséria (1Rs 17,1.7; 18,1-2). Após uma verdadeira epopeia no monte Carmelo (cf. 1Rs 18,20-46), em que o projeto de morte do monarca parecia ter sido definitivamente derrotado, entra em cena a rainha Jezabel e resolve endurecer o cerco contra o profeta de Javé. Jurado de morte, ele se retira para o deserto e esconde-se debaixo de uma árvore, onde pede para morrer e, depois disso, “deita e dorme” (1Rs 19,1-5a).
Impressiona a semelhança, se pensarmos em Acab como o eleito, e Jezabel representar o juiz de Curitiba. Lula não foi para o deserto (autoexílio em países como o Uruguai, que à época abriram as portas para o ex-presidente) e deu no que deu. A fuga de Elias foi providencial.
Mas Javé não o queria dormindo debaixo do junípero. Era preciso que a retirada fosse (ou se tornasse) estratégica. Por isso, um anjo o acorda e diz: “Levanta-te e come!” (v. 5b). Como ele não entendesse bem o recado, o mensageiro repetiu: “Levanta-te e come, pois do contrário o caminho te será longo demais!” (v. 7).
Ficar parado só alimenta o medo. É preciso levantar, sair do ponto de inércia, colocar-se em movimento, ou nada mudará.
Elias é convocado a ir para o monte Horeb (v. 8). O que tem esse lugar de especial? Ele representa o ponto alto de outra caminhada, que não durou 40 dias e 40 noites (como a de Elias), mas 40 anos: a libertação do povo hebreu. Foi no Sinai (= Horeb; cf. Ex 19,1-20,21; Dt 4,10-11) que Moisés recebeu as leis para a organização de uma nova sociedade, totalmente livre do poder opressor do Egito.
É preciso voltar à origem, ao primeiro amor. Eis a questão, não só para o PT, mas para os movimentos sociais. Não esquecer por que existimos. Por outro lado, é preciso entender também os tempos, fazer a correta leitura do cenário. A Moisés, Javé falou pelo trovão (Ex 19,19), com fogo, relâmpago e tremores de terra (Ex 16.18). O povo tinha se libertado, vivia um tempo de autonomia, caminhava perdido no deserto, mas sem o opressor por perto. Elias tinha a Polícia Federal, isto é, o Exército de Jezabel em seu encalço. Deus passou por ele. Entretanto, não estava no furacão, nem no terremoto, nem no fogo; sua voz era uma brisa suave (1Rs 19,11-12).
A noite está começando. É tarde... Um novo dia virá, porém. Agora é hora de se recolher. Dormir será sonhar, e como diria Raul Seixas:
Sonho que se sonha só
é só um sonho que se sonha só.
Mas sonho que se sonha junto é realidade.”
Talvez por isso algumas pessoas encarem sonhar como o momento em que a gente finalmente se desperta. Parafraseando, ainda, o roqueiro baiano:
Justamente acordei
No dia em que a terra parou.”
Volto, portanto, ao fim de meu texto anterior: “É hora de sarar as feridas, o que implica buscar apoio nas amizades, nas parcerias, nas redes.” A hora é de nos reorganizarmos, de nos reinventarmos. É hora de sonhar!
Obs.: O texto completo (partes I e II) pode ser lido no site no CEBI (clique aqui). O título ficou um pouquinho diferente do original (meu post anterior), mas a essência permanece.

sexta-feira, 2 de novembro de 2018

BALADAS PARA ESTES NOVOS(?) TEMPOS


Que dias, senhoras e senhores! Que dias... Parafraseando o Ira!, banda paulistana de rock, estes serão “Dias de Luta”.
Mas devo confessar... Minha primeira reação, findo o pleito presidencial, foi de desesperança e desejo de me exilar no mais profundo silêncio e ostracismo. Eu tive medo. Muito medo! Principalmente após o primeiro pronunciamento do eleito, ou melhor (seguindo a analogia de meu texto anterior com a saga do menino Harry Potter [leia aqui], o primeiro passo para vencer o inimigo é dizendo seu nome): Principalmente após o primeiro pronunciamento de Lord Voldemort.
Nada mais condizente com o feriado de finados do que essa sensação terrível...
Tenho filhas para criar, para ver terminar de crescer, tenho planos com minha esposa, tenho sonhos ainda por realizar... Nada disso se concretizará se:
1)      Eu continuar me confessando socialista;
2)      Ele cumprir com sua palavra (ou ameaça?) de varrer os “extremismos” de esquerda.
Portanto, decidi me calar. Nem para a sala dos professores eu desci essa semana, na hora do recreio. Não queria ouvir falar nada sobre o assunto. Muito menos, olhar para a face de “colegas” eleitores (e o pior: eleitoras) dele. Mas aí...
Voltando àquela música da banda paulistana... Ela começa assim:
“Só depois de muito tempo,
fui entender aquele homem.
Eu queria ouvir muito,
mas ele me disse pouco...”
Até aí, nada demais! Porém, uma colega me pediu para conversar com seu filho, que por acaso é meu educando. Ele não queria mais frequentar as aulas de um determinado professor porque este estaria fazendo campanha aberta para o eleito, digo, o Voldemort, lançando mão inclusive de notícias falsas, como por exemplo a distribuição do kit gay...
(Buenas... se você ainda acredita nisso, clique aqui)
Enfim... Não poderia simplesmente dizer para meu pupilo que aquele educador estava errado. Ou melhor... Nada poderia comentar sobre aquele “colega”, sob pena de ser antiético. Então quis suscitar naquele jovem algo que o instigasse, que o fizesse querer ir às aulas, pois deixar de frequentá-las seria caminho certo para a reprovação.
— Você precisa lutar pelo seu espaço. Como estudante, a escola é o seu lugar. Se abrir mão disso, estará dando força às propostas excludentes do coiso.
Os olhos do guri brilharam:
— Entendi, sôr! Se eu desistir, é sinal que ele ganhou!
E lá se foi ele, bem determinado. Senti-me “aquele homem” da canção. Ao mesmo tempo, eu era o eu-lírico. Eu era aquele menino. Se o sinal bateu, ou alguém falou mais alguma coisa, não sei. Ouvia apenas uma música, que tocava em minha cabeça:
“Busca logo o teu espaço
e firma o pé na caminhada.
Pisa firme neste chão
e toma parte na jornada.”
E o som ficava ainda mais “alto” no refrão:
“Pois aqui tu tens o teu lugar!
Pois aqui tu tens o teu lugar!”
Sem querer, o conselho que dei serviu muito mais para mim do que para o estudante. O que eu lhe disse foi muito pouco, mas, conforme segue o rock “Dias de Luta”:
“Quando se sabe ouvir,
Não precisam muitas palavras.”
É isso mesmo! Pessoas amigas falavam, no dia do resultado, para não desanimar. Mas a tristeza era tanta que eu nada ouvia. Com o jovem, porém, eu deveria parecer sincero. Acontece que eu não sei como parecer sem ser. Então disse-lhe algo que eu mesmo precisava ouvir.
Precisamos lutar pelo nosso espaço. O Brasil é o lugar de todas as brasileiras e de todos os brasileiros. Nesses tempos em que a máxima “ame-o ou deixe-o” parece ressuscitar, é preciso dizer: “Eu o amo sim e, por isso, quero-o livre!”
Vejo muitas de minhas educandas – e educandos – frequentando igrejas que apoiaram a candidatura vencedora. Como educador, sinto que preciso disputar espaço com elas. Mas sozinho não dá! É por essas e outras que, para mim, o hino “O Teu Lugar”, cântico luterano (ouça aqui), parece o mais adequado para este momento, inclusive pelos seguintes versos:
“Vem sarar tuas feridas
e buscar mais liberdade.
Descansar as tuas cargas
sobre a nossa amizade.”
De fato, é hora de sarar as feridas, o que implica buscar apoio nas amizades, nas parcerias, nas redes. Precisamos nos reagrupar, cuidar uns dos outros, descansar e, passo seguinte, repensar a caminhada.
Isso me faz lembrar alguns textos bíblicos, mas esse texto já ficou comprido, de modo que continuarei essa reflexão (pelo seu viés mais teológico) no próximo post. Até lá!