terça-feira, 3 de setembro de 2013

JOVENS, EU VI!

O texto abaixo foi extraído do meu antigo blog "osperegrinos". Há tempos, tenho o propósito de migrar meus textos de lá pra cá, mas... Enfim, uma hora tinha que começar. O que ora segue está revisto e atualizado.

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Meninas e meninos, eu vi! Foi nos idos invernais de 2010, lá em Brasília/DF, mesma terra onde profetizou e morreu Gisley, jovem e padre assessor da juventude. Morreu não... Foi assassinado! Aliás, como acontece com a maioria dos profetas. O fato é que eu vi, e isso aconteceu mais ou menos um ano depois da partida dele.

Por um tempo, eu via – estarrecido – mãos juvenis capazes de matar, sem questionar muito por quais lentes me foi possível ter esta visão. Porém, a partir de novas experiências e à luz de uma nova lente, vi também histórias juvenis tecendo vida, ainda que timidamente, dispersas, isoladas e confusas. E vi que a juventude não tinha uma só, mas várias faces, um caos a ser ordenado.

Era madrugada e havia um jardineiro. Mas não precipitemos os fatos. Convém dizer, antes, que eu não vi sozinho. Havia mais gente lá! Enxergamos primeiramente um túmulo e, então, entramos. Deveríamos avistar um corpo, mas o sepulcro estava vazio. Tomados de espanto, preocupamo-nos mais com a profanação de um cenário de morte do que com a possibilidade da vida, de uma nova criação, um novo jardim. Foi preciso que uma mulher gritasse “Onde ele está?” para despertarmos. Não fosse isso, quanto tempo mais ficaríamos lá dentro, contemplando o nada, confinando nossa gente a um espaço destinado à morte?

Então, vi jovens de diversos grupos saindo de suas catacumbas pessoais, umas e outros logo se acomodando a novas tumbas, mas a grande maioria saindo à procura de uma habitação de vivos. Todos procurando o caminho certo, sem conseguir, todavia, encontrá-lo. Por sorte, conosco caminhava Madalena, que forçou a vista para enxergar alternativas à realidade nua e crua e deu-nos a Boa Notícia: “Eu vi o Senhor!” Diante da novidade, percebemos que não bastava sairmos de nossas covas. Precisávamos aprender a enxergar por nós mesmos, treinar nosso olhar. Além disso, era preciso saber, ainda, o que – ou a quem – procurávamos.

Já falei que vimos um jardineiro? Melhor dizendo: não vimos, não; mas ele estava lá! Conseguimos vislumbrar o jardim, mas nos esquecemos de que, para estar tão bonito, era necessário alguém que o cultivasse. Cabisbaixos, ignoramos a presença de um homem que nos observava. Somente Madalena, inconformada, dirigiu-se a ele, perguntando se tinha levado o corpo do Senhor para outro lugar. Qual não foi sua surpresa ao descobrir que aquele à sua frente não era um jardineiro comum, mas o responsável pela beleza do Jardim da Criação, ou seja, o amado a quem ela tanto procurava? Nesse momento, amanheceu e Madalena pode vê-lo claramente.

Teimávamos em não acreditar nos fatos. Lamentávamos a morte, em vez de perguntar por que mataram o Mestre. Ele fora executado como criminoso político, isso nós sabíamos. Mas por que, se ele falava de um Reino que nem deste mundo era? Tínhamos muito medo de fazer esta pergunta. Entretanto, quando amanheceu, fomos às ruas. Por que Ele morreu? Por que morrem os jovens? Quem está nos matando? Por que estão fazendo isso? Quando percebemos que a morte dele não tinha sido acidental, deduzimos não terem, também as demais, acontecido por acaso. E isso – essa grande descoberta – certamente vai incomodar quem está querendo nos matar, sufocar, silenciar, tornar invisíveis. Entretanto, não sem uma boa dose de coragem, decidimos enfrentar esses assassinos, uma vez que, igual à Madalena, “vimos o Senhor”.

Abrindo-se nossos olhos, vi a juventude se organizando em mutirão. Cada qual preservando sua identidade. Cada qual voltando para seu lugar de origem. Mas todos dispostos a manter a unidade. Percebemos, finalmente, que com grupos pequenos, agindo em rede, derrotaremos o opressor. Assim, vi os grupos trocarem juras de comunhão e fraternidade, prometendo multiplicar esse encontro, essa experiência em suas bases.

Enfim, meninas e meninos, foram essas – além de outras, a serem contadas em outro momento – as coisas que eu vi. As juventudes, dispersas em meio à escuridão da madrugada, ansiosas pelo sol prestes a despontar, perceberam na Bíblia uma ótima ferramenta para ver e seguir a Cristo, o Jardineiro. O encontro, em local e situação inesperados, porém livres das amarras institucionais, só foi possível porque deram-lhes novas lentes, as da Hermenêutica Juvenil.

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[*] Texto inspirado em Jo 20,1-18 e no Seminário Nacional de Bíblia e Juventudes, acontecido em Brasília/DF, de 16 a 18/07/10, promovido pelo CEBI, em parceria com a CAJU, a REJU, o FALE e a Trilha Cidadã, entidades religiosas que trabalham com juventudes do meio ecumênico.