Às vésperas de sua votação na Câmara Federal, urge saber se já foi
feita a pergunta-chave da questão: a quem serve a redução da maioridade penal?
Os defensores querem nos fazer acreditar que estão preocupados com a segurança
da população, ou melhor, dos homens (e mulheres?) de bem da nossa sociedade.
Mas, diante do histórico de nossa classe política, acreditem: deve haver outra
explicação.
Partindo da suspeita de que os políticos sempre defendem seus próprios
interesses e os de quem os patrocina, você já parou para se perguntar quem são
os doadores de campanha dos apoiadores da redução? Conhece o ramo de atividade
de empresas como a Umanizzare Gestão
Prisional? Sabe dizer quem lucraria, caso o sistema prisional brasileiro
fosse totalmente privatizado, com o aumento da população carcerária?
O Brasil já é uma fábrica de presidiários há algum tempo. Não por
acaso, temos a 4ª maior população carcerária do planeta. Se adotarmos a
redução, então... Baita negócio (para quem vê isso como um negócio, business), não é mesmo!? Curiosamente, o
líder mundial já adota o mínimo de 16 anos em algumas de suas federações, mas estuda
aumentar a maioridade penal. Estou falando dos EUA. Os estudos lá apontam que,
entre os adolescentes, os tratamentos de reabilitação são mais eficazes do que
a punição. Oh, descobriram a América!
As razões para a redução são evidentes. Mas quem liga para razões?
Estamos em 33 d.C. A farsa, digo, o tribunal está em sessão. O suspeito é um
galileu. Após ouvir as acusações, Pilatos, o juiz, pergunta ao réu: “Sendo tu um zé-ninguém, é verdade que
queres ser rei, isto é, um líder independente de Roma?” O sujeito à sua
frente, já sabendo qual o veredicto, decide não pactuar com a armação e
recusa-se a representar o seu papel, finge esquecer sua fala. Seu silêncio é
constrangedor. O tribuno lança uma nova deixa: “O que tens a dizer?” O outro nada responde. A plateia já ameaça
umas vaias. Então o roteirista introduz um novo quadro: você decide! Chamam uma
nova personagem, um black block. O
rapaz foi às ruas manifestar sua indignação, houve um confronto com a guarda
romana, alguém disse que ele e seus comparsas estavam bêbados, ninguém soube
muito bem como começou a briga, um policial foi mortalmente ferido. E então?
Quem vocês querem que eu solte? O baderneiro ali, ou esse outro que quer viver
livre do poder romano? A escolha é fácil, pois acusação mesmo só há contra um
dos candidatos. Mas quem patrocinou o espetáculo quer ver a execução do outro, o
que é contrário ao financiamento das campanhas imperiais. E tudo por quê?
Porque o cidadão resolveu denunciar a corrupção e os verdadeiros interesses da
bancada sacerdotal. Vai daí que se inicia no meio dos presentes – gente de bem,
gente muito séria, mas muito favorável ao status
quo – um burburinho. “O fulano é de
Nazaré. Diz aí: de lá pode sair coisa boa? Não sei muito bem o que ele fez,
mas... e se fosse com o seu filho? Fosse com o meu filho o quê? Sei lá! Mas, e
se fosse?” Bastou que um começasse para todos gritarem: “Solte Barrabás!” E o cabeludo? “Crucifique-o!”
Os jovens que hoje estão aí, em vias de serem presos, são também uma
denúncia: a constatação de que o Estado falhou. O que resta fazer com quem não
tem respeitado o direito à vida? Com quem não tem moradia digna, nem
alimentação saudável e balanceada, nem incentivos para o lazer e a prática do
esporte, não tem acesso ao espaço público, muito menos educação de qualidade?
Melhor encarcerá-los do que mantê-los à vista da gente de bem. Afinal, a
consciência só dói quando o problema está à nossa frente. Eles são, enfim, a
denúncia de que há pobres em nosso meio. Ora, se eles estão aí é porque há
também os que acumulam riqueza. Para estes, não interessa se é razoável a
máxima de que o tratamento é melhor do que a punição. Afinal, para que
desperdiçar os insumos de um grande negócio à vista?
Num país de impunidade como o nosso esse é um grande negócio!
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