domingo, 15 de dezembro de 2013

Juventudes – Tolerância e Solidariedade num Mundo Pluralista

Alguém aí duvida que estamos num mundo plural? A diversidade é um fator essencialmente humano. Temos velhos e crianças, negros e amarelos, homens e mulheres (homos ou heteros), cristãos e muçulmanos, ditadores e democratas, apolíticos e ateus, dominantes e dominados. Epa, dominantes e dominados? Sim, dominantes e dominados! Sendo assim, é possível dizer que vivemos num mundo pluralista?

Perguntinha complicada... O cara começa afirmando que o mundo é plural e, pouco depois, quer saber se ele é pluralista. Não é tudo a mesma coisa? Não, oras! Ser plural é ter, por definição, mais de uma possibilidade. Por outro lado, ser pluralista é mais que admitir a existência do diferente; é querer e promover a diversidade.

Então voltemos à pergunta: Vivemos num mundo pluralista? Bom, se aceitamos a existência de dominantes e dominados, admitamos também que aos primeiros só interessam suas próprias diferenças. Quem não pertence à elite, ou aceita as regras, ou é varrido pra debaixo do tapete. E parece que tem muita gente com medo de se misturar à poeira, pois compramos direitinho as ideias plantadas pelos nossos opressores. Assim, passamos a aceitar o diferente como errado, inferior.

Um exemplo simples: A Paz mundial. Qual é a tua ideia de Paz? Um lugarzinho afastado, no alto da serra, passarinhos cantando, o barulho da água correndo, ninguém brigando com ninguém? Ah, tá... Tira o alto da serra, os passarinhos cantando e o barulho da água, mas deixa ninguém brigando com ninguém. Que maravilha! Todo mundo se entendendo, uma comunidade sem partidos políticos, uma só religião, homens que se comportam como homens, mulheres que se comportam como mulheres, velhos e crianças respeitando seu papel na sociedade... Resumindo: Tudo correndo conforme o combinado, certo!? Pois bem... Lamento informar, mas isso não é Paz; é uma ditadura!

E o que são as elites dominantes senão um bando de ditadores? Eles ditam a moda, o uso correto da língua, a opinião da grande mídia, os comportamentos social, econômico e sexual, as boas maneiras e os bons costumes, toda a nossa cultura, enfim. É a padronização, isto é, a uniformização, prática comum até em movimentos auto-denominados ecumênicos. Quer ser bem sucedida ou sucedido, seja assim, e pronto!

Então, o que fazer!? Deixar que impere a violência, que os povos se matem? Pra começo de conversa, não há violência maior do que impor aos outros um único modo de ser, pensar, orar e agir. Isso não é harmonia, mas o auge da intolerância. O diferente não é digno sequer de solidariedade porque não deve ser incentivado. Ora, a supressão de outras culturas, outras opiniões, outras crenças, outros modos de ver o mundo, isso sim é deixar que impere a violência, é matar, isto é, extinguir as vozes discordantes.

Ao lado das mulheres, uma das principais vítimas desse sistema excludente são os jovens. Ambos são cooptados pelo padrão ditado por homens brancos, ricos e adultos. Logo, ser jovem e mulher ao mesmo tempo não é lá uma situação muito confortável. Negra e pobre, então... Mas vamos nos concentrar nas juventudes, foco desta reflexão.

Está em voga a discussão em torno da maioridade penal. Querem maior sinal de intolerância e falta de solidariedade do que isso? Responsabilizar um grupo pela criminalidade e violência do país porque é composto por jovens – e, nas entrelinhas, negros e pobres, pois para estes é que os presídios são construídos. A coisa funciona mais ou menos assim: eu ponho você à margem da sociedade por não preencher os requisitos necessários para estar entre os “eleitos”, e se você se rebelar, sofrerá as consequências. Dito de outra forma: eu crio os monstros e os alimento para, no tempo oportuno, colocá-los numa arena e proporcionar pão e circo aos meus súditos. Enquanto a população sacia sua fome de “justiça”, ninguém questiona as verdadeiras causas (e causadores) da violência.

Percebem quem deveria estar preso nessa história? Enquanto isso, os presídios vão ficando superlotados, não dos mentores, mas das vítimas de um sistema violento. Uma vez punidos, quantos se regeneram? Não acontece o contrário? A pessoa entra como ladrão de galinha e sai como membro de quadrilha organizada. É isso que queremos? Cada vez mais jovens especializados no crime? Quando vamos questionar as razões para os crimes de colarinho branco serem tratados de forma infinitamente mais branda do que o roubo de um par de chinelos? Até quando vamos dar razão a quem decide jogar sobre os jovens sua própria culpa?

Ok, apontar os culpados, por si só, não resolve. No fundo, sabemos quem eles são. Entretanto, de modo geral, a população se sente impotente para lutar contra seus verdadeiros opressores. Mas é desejo de todas e de todos vivermos num mundo melhor. E isso não é de hoje. Em seu livro, o profeta Joel narra sua imagem de um mundo perfeito: “Depois disso, derramarei o meu espírito sobre toda carne. Vossos filhos e filhas profetizarão, vossos anciãos terão sonhos, vossos jovens terão visões. Até sobre os escravos e sobre as escravas, naqueles dias, derramarei o meu espírito” (Jl 3,1 – Bíblia católica; Jl 2,28 – Bíblia protestante). Homens e mulheres, livres e escravos, profetizando em pé de igualdade. Anciãos, consultados normalmente por sua capacidade de ver, isto é, analisar a realidade, sonharão. Pessoas jovens, consideradas sonhadoras (Ingênuas? Aéreas? Inexperientes?), serão capazes de ver. Que mundo perfeito... Mas conta com duas diferenças em relação ao nosso. Primeiro, isso é fruto do Espírito de Javé. Segundo, não adianta cruzar os braços e ficar esperando; é preciso lutar: “Forjai de vossas relhas espadas, e de vossas podadeiras lanças. Que o fraco diga: ‘Eu sou um herói!’” (Jl 4,10). Ou seja: Apontar os culpados não resolve, mas descobrir quem são é passo fundamental para mudarmos a realidade.

Como mudar? A concretização da profecia de Joel se dá em Pentecostes (At 2,1-12). O Espírito Santo, em forma de línguas de fogo, desce sobre todos os que estavam reunidos (portanto, não somente sobre os Apóstolos) e eles (e elas?) começam a falar em outras línguas. Os ouvintes, provenientes de diversas nações (e culturas e religiões, consequentemente), conseguem compreendê-los. Mais que isso: ficam maravilhados. O resultado já sabemos: o cristianismo se espalha pelo mundo. Porém, será que, com isso, vem junto a mensagem daquele dia? O texto não fala de conversões em massa. Aliás, não registra uma conversão sequer. Fala das línguas dos ouvintes, mas não de quais línguas eram faladas sob inspiração divina. Ora, então que mensagem é essa que deixa a todos maravilhados? Em Babel, o projeto de uma única língua, uma única cidade, uma única torre “capaz de tocar o céu” caiu por terra, e os homens (e mulheres), apesar de falar uma língua só, não mais se entendiam (Gn 11,7). Então, que línguas são essas que os homens (e mulheres) de diversas nações são capazes de entender? Não seria a linguagem do amor? Não seria o amor capaz de respeitar as diferenças e propor, em vez da uniformidade, a unidade? Não seria a unidade capaz de gerar tolerância e solidariedade entre os povos? Jovens tendo visões e anciãos sonhando não seriam um sinal dessa unidade? Conseguiríamos, portanto, mudar essa realidade de exclusão dos que não se enquadram no padrão uniformizador das elites se acolhêssemos os diferentes (jovens, negros, pobres, mulheres, estrangeiros, bêbados, prostitutas, moradores de rua...) da maneira como são? Em vez de mudá-los, não seria melhor perguntar por que não são aceitos? Visto assim, será que é muito difícil mudar?


Se queremos a Paz, preparemo-nos para a Paz. Temos que cobrar, sim, das autoridades, fazer com que respeitem nossos direitos. Mas precisamos ter ciência de que nossa luta não é só nossa. Jesus acolhia bêbados e prostitutas, mas não se tem notícia de que era bêbado e prostituto. Abraçava leprosos, mas não se tem notícia de que tenha morrido por causa da lepra. Acolher o outro não é tornar-se semelhante a ele, senão na luta por um mundo mais justo e fraterno, tolerante e solidário. Não deveria ser esta a proposta dos movimentos ecumênicos? Não seria este o papel do autêntico ecumenismo (não o uniformizador, mas o pluralista, gerador de unidade)? Estejamos atentas e atentos a isto: Os jovens querem viver! Os idosos querem viver! As mulheres querem viver! Os negros querem viver! Ora, quem é capaz de impedir isso? Esse, senhoras e senhores, é o verdadeiro inimigo.

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