quarta-feira, 5 de setembro de 2012

QUANDO O DISCURSO VAI PRO BURACO

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O causo a seguir é uma adaptação de um dos esquetes do curso de Teatro e Bíblia, realizado no Rio Grande do Sul, voltado especialmente para o público juvenil, mas já adaptado, em diversas ocasiões, para outros grupos. Espero que gostem...
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Estavam todas e todos a postos. O Presidente, Bíblia em punho, daria início à reunião. Não havia quem não admirasse o modo do Seu Zé interpretar as Escrituras. E ele dizia:
– Fazer justiça ao órfão, defender a causa da viúva, amados irmãos e irmãs, é socorrer os pobres, os marginalizados de hoje...
Várias cabeças balançando em sinal de aprovação. E ele prosseguia:
– Bem, pessoal! Hoje, retomamos o projeto social da nossa Igreja. Cumpre a nós continuar defendendo os órfãos e as viúvas do nosso tempo. Chamei vocês aqui porque tem trabalho pra todo mundo...
No meio da conversa, eis que entra D. Sílvia, a cara entre assustada e aflita. Todos percebem sua angústia. Alguém puxa uma cadeira:
– Sente-se, minha senhora! Quer um copo d’água?
– Não, obrigada! Eu só vim porque tenho um problema e me disseram que vocês poderiam ajudar.
Seu Zé olha pro céu, agradece a Javé, o Deus dos pobres, que enviou aquela mulher para confirmar que a Obra é de Seu agrado.
– Pois a senhora veio ao lugar certo. Como é o seu nome?
– Sílvia! Eu vim aqui porque tem um buraco na minha rua. Já falei com a prefeitura, com a agência de saneamento, as companhias de luz e telefone, e nada! Ninguém tá nem aí! E olhe que é ano eleitoral...
– Pois olhe... É até melhor assim. Ficar devendo favor pra político é um atraso de vida. Mas me diga, D. Sílvia, a senhora trabalha?
– Faço meus bicos...
– A senhora sabia que estamos iniciando um grupo de ação social aqui na Igreja? Desenvolvemos vários trabalhos muito legais que podem envolver toda a família. Hoje, por exemplo, faremos uma oficina de panificação.
– Hum...
– Como é a vida lá na sua rua? O pessoal é bem pobre, né!
– É, mas...
– Quantos filhos a senhora tem?
– Oito.
– Oito? Sabia que temos um trabalho específico para as crianças? Inclusive, nos dias de celebração, elas ficam com algumas gentis senhoras da comunidade que adoram contar historinhas bíblicas.
– Mas eles são grandinhos...
– Bom, então os mais velhos podem participar do grupo de jovens. Pelo menos, enquanto estão na Igreja, sabemos que não estão em más companhias, metidos em algum problema...
– Epa, peraí só um minutinho! Meus filhos não são muito de Igreja, vá lá... Mas nunca se envolveram com drogas ou coisa pior. Eles são trabalhadores, somos gente honesta...
– Calma, D. Sílvia, é modo de falar... É que esses jovens de hoje andam tão carentes de orientação...
– Não os meus filhos, isso eu lhes asseguro.
– Ok, ok, não precisa se zangar! Olha só... Que tal a senhora vir participar aqui com a gente. Temos um monte de outras coisas bacanas pra fazer. Às quartas é dia de entregar cestas básicas para as famílias carentes.
– Hum, tem um pessoal lá perto de casa que está mesmo precisando...
– Então, viu que legal! A senhora pode ajudá-los.
Seu Renato achou melhor reforçar o argumento do Seu Zé:
– E, certamente, a senhora vai se sentir bem por isso.
Seu Zé, que já havia falado sobre fazer o bem sem esperar recompensa, emenda:
– Claro, ajudar os outros sempre faz a gente se sentir melhor. Mas fazer o bem aos pobres é, antes de tudo, dever evangélico.
D. Sílvia, tentando assimilar tanta informação, limita-se a um aceno de cabeça, como quem está ponderando sobre o assunto. Sentindo a hesitação, Seu Zé faz outra proposta:
– E que tal o grupo das merendeiras? Elas fazem um sopão para reforçar o lanche que as crianças mais carentes ganham na escola. O que sobra, eu e alguns amigos aqui da comunidade distribuímos, junto com cobertas, para esquentar a noite dos moradores de rua.
– Olha, parece interessante... Mas vem cá! E o buraco lá da minha rua?
D. Olívia, que até aquele momento estava de espectadora, não se conteve:
– Ih, dona! Tando aqui com a gente, a senhora nem vai mais lembrar que o buraco existe.
D. Sílvia agradeceu e foi-se embora. Dizem que fundou uma associação de moradores do bairro. Continua brigando com a prefeitura por causa de outros buracos. O grupo de ação social? Vai muito bem! Hoje, a oficina é de tricô e crochê.

3 comentários:

  1. Olá gostei do seu blog, estou ensaiando num futuro próximo criar o meu, mas ainda tenho muito a ler de outros blogs para desenvolver minha linguagem.

    gostaria de receber suas atualizações, se possível via Facebook.

    Obrigado

    Leandro Pio Barrionuevo
    http://www.facebook.com/leandropiomb

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  2. Um causo pra ninguém botar defeito. Vou socializar em outras redes que tenho certeza que gostaram da leitura!

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  3. entre palavras e linhas a reflexão de diversas realidades...
    Bonito texto, empolgante, claro e que provoca pensar...
    "pensar é perigoso"
    Abração

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